Em 1991, eu presenciei uma cena marcante para o Rap Nacional. MCs e DJs, que participavam das gravações da coletânea “Movimento Rap II – A explosão do Rap Nacional”, estavam reunidos num estúdio em Moema, bairro nobre da cidade de São Paulo. Os produtores repassavam algumas bases, os jovens artistas conversavam sobre as origens de cada grupo, trocavam idéias e falavam sobre sua possível trajetória musical. Num determinado momento, o diretor executivo do projeto entrou no recinto e falou em tom ameaçador aos produtores: "Não quero nenhum grupo aqui no estilo dos Racionais Mcs! Não quero nenhum grupo com letras fortes e de protesto, o papo aqui é outro, quero vender esse disco!" O Rap dos Racionais causava desconforto. Era crítico. A postura dos seus integrantes era diferente. Brown, Edy Rock, Ice Blue e KL Jay mostravam uma rebeldia que, de certa maneira, trazia independência para os artistas. Uma má influência para os grupos, na visão dos donos de gravadoras que também eram os donos das equipes de baile e das agendas de shows. Integrantes de um conjunto chamado Facção Central estavam entre os jovens naquele estúdio de Moema. O produtor executivo nem imaginava, seus esforços seriam em vão. Formado em 1989, na região central de São Paulo (Glicério, Cambuci e Ipiranga), o grupo Facção Central passou por várias mudanças até chegar ao estilo que o destacou na cena Rap e o transformou num dos grupos mais amados e odiados do Brasil. Os componentes Eduardo (compositor e intérprete) e Dum Dum (intérprete) conviveram desde a infância com violência social, tráfico de drogas, vícios, violência policial, delegacias e presídios. É esse o conteúdo do trabalho do Facção Central, grupo que teve a veiculação do vídeo-clipe “Isso aqui é uma Guerra” proibida na TV brasileira, considerado pelas autoridades como apologia à violência. A poesia dura de Eduardo retrata parte da nossa realidade, cada verso pode comover, mesmo quando não se compartilha de sua visão. Em seus shows, os jovens são inseridos e escolhem viver neste recorte social. Eduardo sabe que suas rimas não representam a favela e a periferia de maneira total. O artista, no final das apresentações, pede calma ao público, fala sobre tolerância e paciência para se chegar em paz em casa. Sem dúvida, o rapper conhece o lado bom do cotidiano dos subúrbios. Seu Rap é uma escolha política. Em 20 anos de Facção, Eduardo e Dum Dum conquistaram fãs, seguidores e, infelizmente, várias cópias de má qualidade. Os discos do grupo sempre colocam quem não os compreende como membros do outro lado, da outra classe social. Mas Dum Dum e Eduardo não são unanimidades na periferia. Eles são heróis para alguns, não para todos. Os que defendem a postura do Facção dizem que se opõem aos alienados e reprodutores das idéias dos playboys. As pessoas que não suportam as rimas do grupo afirmam: não basta apenas falar sobre a realidade, estamos cansados deste discurso, queremos coisas novas. Hoje, os rappers do Facção estão envolvidos em projetos solos. Preparam algo para 2009, algumas músicas do Dum Dum já estão circulando pela Internet. Eduardo foca seus esforços num projeto literário. Com efeito, o Facção Central é um dos grupos mais polêmicos e importantes do Rap Nacional. Ao conectar o fracasso, o desespero, a humilhação e o ódio, a poesia de Eduardo mostra que não precisa ser apenas ouvida, a realidade periférica cantada pelo Facção Central necessita ser refletida, numa apurada seleção de informações, para provocar mobilidade.
- O fato é que o Facção conquistou seu lugar na história do Rap brasileiro. Querer apagar este fato por ideologia ou convicção artística é ignorar a conexão que estes rappers fizeram com a juventude.
- Discografia:
- Albúns :
- Titulo: Juventude de Atitude
- Ano: 1995
- Gravadora: Discoll Box
- Músicas que se destacaram: "Artistas ou Não"; "Fone Maldito"; "A Malandragem Toma Conta".
- Titulo: Estamos de Luto
- Ano: 1998
- Gravadora: Discoll Box
- Músicas que se destacaram: "Brincando de Marionetes"; "Detenção Sem Muro".
- Titulo: Versos Sangrentos
- Ano: 1999
- Gravadora: Discoll Box
- Músicas que se destacaram: "Isso aqui é uma guerra"; "A Minha voz está no Ar"; "12 de outubro".
- Titulo: A Marcha Fúnebre Prossegue
- Ano: 2001
- Gravadora: EUO Entertainment
- Músicas que se destacaram: "A Marcha fúnebre Prossegue"; "Desculpa Mãe".
- Titulo: Direto do Campo de Exterminio
- Ano: 2003
- Gravadora: Face da Morte Produções
- Músicas que se destacaram: "Eu não pedi pra nascer"; "Estrada da Dor 666"; "Hoje Deus anda de Blindado"; "O Menino do Morro"; "São Paulo AUCHWITZ".
- Titulo: Facção Central - Ao Vivo
- Ano: 2005
- Gravadora: Sky Blue Music
- Titulo: O Espetáculo do Circo dos Horrores
- Ano: 2006
- Melhor álbum, Grupo do ano e Voz do Povo (Hip-Hop Top 2006)
- Gravadora: Facção Central
- Coletâneas:
- Movimento Rap II, Explosão do Rap Nacional
- Música: "Cor".
- Made In Brasil - Vol. III
- Música: "Brincando de Marionetes".
- Das Ruas Para o Mundo
- Músicas: "Enterro de um Santo" e "Não é Mais Como Antigamente".
- Linha de Frente
- Músicas: "Estamos de Luto; "Artistas ou Não?"; "A Malandragem Toma Conta".
Um comentário:
show de bola...
facção eh foda...
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